O Eufemismo suaviza a relação entre as pessoas, mas pode esconder a realidade social e política

Visitando textos sobre o tema, trouxe contribuições para a pequena manifestação jornalística e literária, que pretendo oferecer para leitura rápida.

eufemismo é uma figura de retórica caracterizada pela substituição de um termo contundente por palavras menos desagradáveis ou mais polidas, sem alterar o sentido, apenas o atenuando. Essa estratégia argumentativa é bastante utilizada para se referir a tabus, buscar um discurso mais neutro e diplomático ou mascarar interesses políticos. Seu uso anda tão em voga, que muitas vezes pode até passar despercebido.

Ingedore Koch, professora de linguística da Unicamp e autora de dezenas de livros sobre argumentação e linguagem, afirma que o eufemismo é “um recurso retórico, uma estratégia argumentativa a serviço de um projeto de sentido: é preciso convencer alguém de que algo não é tão grave. Apresenta-se a realidade sob luz cor-de-rosa”. Ou seja, diminui-se a força de uma afirmação, para torná-la mais aceitável.
Exemplos:
Hoje em dia, os temidos agrotóxicos são chamados de defensivos agrícolas. A guerra do Iraque era chamada de ofensiva militar. A invasão tornou-se ocupação no dicionário do MST. O tsunami financeiro do New York Times virou a marolinha do Lula. Ainda nos meses mais graves da crise econômica mundial, os jornais anunciavam o socorro do governo americano aos bancos em troca de ações, o que em termos mais claros significa a estatização de bancos.
Todo discurso tem sempre uma finalidade. O uso dessa estratégia argumentativa está diretamente ligado à preocupação de um falante com a recepção de sua fala. Eufemiza-se aquilo que pode causar muito impacto. Recentemente, Lula soltou mais uma de suas pérolas protocolares, mas que revelou claramente o cerne da fala política.

“Imaginem se um de vocês fosse médico e tivesse um paciente doente com uma doença grave. O que falariam para ele? Olha, a medicina avançou demais, os exames e os medicamentos estão mais sofisticados. Você vai se recuperar. Ou vocês diriam para ele? Óh meu, sifu.”

Lula foi duramente criticado pelo seu “sifu”. Não é uma expressão que caiba bem em um pronunciamento público de qualquer autoridade, menos ainda do Presidente da República. De qualquer forma, o petista escancarou o uso do eufemismo no discurso político. Não era bom que a população soubesse da real intensidade da crise. Ou melhor, não era politicamente interessante que o povo tivesse essa ciência.

O poeta Manuel Bandeira costumava referir-se à morte como “a indesejada da gente”, evitando o peso da palavra. Os eufemismos fazem parte do nosso cotidiano linguístico.
Cabe a nós, irmos além das palavras e refletir: por que se deseja suavizar um assunto? Pode ser desde um simples “deixar uma pessoa bem”, até um complexo interesse político.
https://pbs.twimg.com/profile_images/895772431457157121/n8bWszjh_normal.jpgHoje, o MTST invadiu o prédio da sede da presidência da República em São Paulo. Movimentos de massa (e “movimentos sociais”), como demonstrei em meu livro Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs, as manifestações que tomaram as ruas do Brasil, buscam sempre a tomada à força de prédios públicos. É uma lição antiga, como já havia demonstrado Elias Canetti, no clássico Massa e Poder.

A manchete para um caso como esse é óbvia: MTST invade prédio da Presidência. Algo que, naturalmente, geraria escândalo nacional. Tente imaginar a troca de sujeitos: “Movimento pró-impeachment invade Palácio da Alvorada” ou “Evangélicos invadem Supremo Tribunal Federal”.
https://pbs.twimg.com/profile_images/895772431457157121/n8bWszjh_normal.jpg
Manchetes objetivas dificilmente serão exibidas sobre o MTST. A imprensa os incensa, os justifica, os trata apenas com eufemismos. O MTST ou o MST sempre são tratados pela imprensa a pão-de-ló. Apesar de praticamente sua única atividade ser a invasão de propriedades alheias, razão da existência do movimento, desde a década de 90 que a rede Globo (chamada de “golpista” pela esquerda) apenas os defende. Mesmo na novela O Rei do Gado, o personagem do título, Bruno Mezenga, interpretado por Antônio Fagundes, não cansava de defender os sem-terra, além de mostrar defesas políticas do MST e dos assim chamados “sem terra”.

No caso da invasão de hoje, as manchetes, seguindo uma harmonia difícil de ser alcançada mesmo regida pelos maiores maestros do mundo, continuaram se focando no contrário: na polícia que precisou tirá-los de lá. E a violência, naturalmente, fica na conta da polícia.



Manchetes com EUFEMISMO publicadas nos jornais sobre o MST OU MTST

PM atira bombas em manifestação do MTST no prédio da presidência na Avenida Paulista 

O Estadão prefere a manchete “Com bombas, PM dispersa ato do MTST contra Temer”. A violência, de novo, fica só com a polícia, essa entidade nazifascista de direita que agride pessoas “sem teto” a esmo, sem motivo.


MTST ocupa prédio da Presidência em São Paulo; PM usa bomba contra ato


Como esperado do jornal, o MTST só “ocupa”, no típico vezo jornalístico de usar “ocupação” como sinônimo de invasão, sabendo-se ser não só um eufemismo, mas um outro conceito. Ocupa-se um lugar que pode ser ocupado por outro, como um banco de praça ou um assento sanitário. O que o MTST fez foi uma invasão. Já a ação policial é tratada com sensacionalismo: “PM usa bomba”. Era para usar o quê? Flores? Carteiras de trabalho?

O carioca O Globo não noticiou. A única com objetividade das grandes publicações foi a Veja, que, mesmo não divulgando no Twitter, registrou o fato óbvio: “MTST invade prédio da Presidência da República em SP“.

Seria difícil entender o motivo para a inversão eterna em todos os grandes veículos de mídia do país – que dirá nas revistas e sites menores, sempre mais declaradamente pró-PT, de viés esquerdista e mancomunados com “movimentos sociais”. Por exemplo, João Pedro Stédile, dono do MST, é colunista da versão brasileira do jornal Le Monde. Já o Vermelho.org, cujo nome diz a que veio, posta a manchete hilária “Polícia invade manifestação do MTST com bombas e prende manifestante”.

Enquanto os norte-americanos e europeus se preocupam mais com eufemismos "politicamente corretos" e as consequências jurídicas para quem se afasta dessas normas, o Brasil produz outra classe de eufemismos, na verdade mais destinada a disfarçar para o consumidor a realidade de um país em que tudo é "especial", desde a tecnologia para rodar nas estradas "especiais" de nosso país, até a forma de se referir a carros usados, de segunda mão. Eles, como os imóveis, não são mais "usados", são "seminovos".
Logo veremos, talvez, mulheres semigrávidas. Estamos semipresos em nossas casas pelo crime desenfreado, praticado por semicrianças que brincam de bandido e polícia com seus revólveres carregados e podem ser analfabetas, mas sabem na ponta da língua que artigos da Constituição invocar em sua defesa. São "di menor".
Em meio aos eufemismos que tentam suavizar a dureza da realidade nacional, também estamos semimortos graças ao sistema médico brasileiro, com seus semi-hospitais, semiambulatórios, médicos semiformados, semiplanos de saúde, todos funcionando apenas parcialmente... se tanto!.
Temos um Congresso em duas metades que não se completam, bem simbolizadas pela arquitetura de sua sede brasiliense. Temos leis com apenas metade da força, podem pegar ou não.
Temos também – no máximo - meia Educação, meia Justiça, meio sistema habitacional, meio investimento em pesquisa e desenvolvimento, meio planejamento urbano e logístico, meia cultura, meia Internet, meia telefonia, meia fiscalização de qualidade nos produtos, meio controle do sistema financeiro, ferrovias semiacabadas, meias hidrovias, meio sistema energético, meias condições para a economia crescer... só os impostos são mais que completos, são até o dobro do que em outros países...
Até os estádios (perdão, arenas) da Copa do Mundo estão semiprontos, como se fossem aqueles alimentos que é só esquentar e servir. Foram onze anos para que o Brasil se preparasse, e já sabemos que nem assim estarão terminados para o evento, mesmo com as broncas da Fifa. Pior ainda são as soluções de infraestrutura para o evento, com aeroportos pela metade e contas das empreiteiras em dobro.
E, passados os jogos, muitos locais ficarão semiabandonados, cumprindo a sina dos grandes empreendimentos públicos, "meio planejados", para usar mais um eufemismo, daqueles que caem por terra junto com as obras semiacabadas.
Conclusão:
Certo é que o eufemismo é uma forma suave, educada de dizer coisas fortes e negativas. Mas também é um jeito de amenizar práticas políticas indesejadas e crimes. Ao mesmo tempo que protege as relações sociais de palavras mais ásperas, pode esconder a realidade em que vivemos, evitar tomadas de posição e causar prejuízo à sociedade. Na verdade, o Eufemismo tem que ser lido e recebido com prudência pelo leitor. Evita brigas e confusões nas relações pessoais, mas pode esconder a ineficiência de um governo, esconder ou provocar uma guerra mundial.  
https://pbs.twimg.com/profile_images/895772431457157121/n8bWszjh_normal.jpgFontes:
https://www.portogente.com.br/colunistas/carlos-pimentel/81971-brasil-o-pais-dos-eufemismos
O Eufemismo suaviza a relação entre as pessoas, mas pode esconder a realidade social e política O Eufemismo suaviza a relação entre as pessoas, mas pode esconder a realidade social e política Reviewed by JAB-Jornalista Aureliano Borges on janeiro 29, 2018 Rating: 5

Nenhum comentário:

Tecnologia do Blogger.