Cidadania é uma conquista diária, que o cidadão pratica e ao mesmo tempo pode cobrar do seu representante no poder público
O conceito de
cidadania passou por um processo evolutivo no Brasil. A partir da abolição da
escravatura, da conquista do
voto feminino, passando pelo
período de redemocratização do país, com o movimento das “diretas já”, do impeachment
do Collor, até a efetivação de
direitos sociais, verifica-se que o
cidadão tem conquistado espaços de maior presença na condução do destino de
nosso país.
Foi a partir de 1988, da Constituição Cidadã, que novos instrumentos foram colocados à
disposição dos que lutam por um país cidadão, como por exemplo, o sufrágio
universal, o voto direto e secreto,
além do surgimento de estatutos como o Estatuto da Criança e do Adolescente,
Estatuto do Idoso.
Apesar de estar em processo evolutivo, a cidadania
é uma conquista diária. Não há como compreendermos o conceito de cidadania sem
considerarmos seus vários aspectos e sua relação com os direitos humanos, com
democracia e ética.
Cidadania implica
viver em sociedade, na construção de relações, na mudança de mentalidade, na
consciência e reivindicação dos direitos, e também no cumprimento dos deveres.
Isto se aprende na luta diária, nos exemplos e principalmente com a educação de
qualidade, ferramenta que permite que o indivíduo possa desenvolver suas
potencialidades e conscientizar-se de seu papel social, como cidadão.
A
partir do início dos anos 90, o uso do termo “cidadania” se difundiu cada vez
mais pela sociedade brasileira. Enquanto a noção redefinida continuou
subjacente às lutas populares e às práticas políticas de partidos políticos
como o PT, e ONGs, como as congregadas na Associação Brasileira de Organizações
Não Governamentais (ABONG), a cidadania esteve também por trás de campanhas de
solidariedade voltadas para a mobilização da classe média, tais como a Ação da
Cidadania contra a Fome, liderada por Hebert de Souza (Betinho), ou as
associações de empresários progressistas, tais como a CIVES (Associação
Brasileira de Empresários pela Cidadania).
A
nova cidadania requer a constituição de sujeitos sociais ativos, definindo o
que eles consideram ser os seus direitos e lutando pelo seu reconhecimento.
Nesse sentido, ela é uma estratégia dos não-cidadãos, dos excluídos, uma
cidadania ‘de baixo para cima’. (DAGNINO, 1994,p.108) A experiência dos
movimentos sociais é fundamental para essa construção da cidadania. “Na
organização desses movimentos sociais, a luta por direitos – tanto o direito à
igualdade como direito à diferença – constituiu a base fundamental para a
emergência de uma nova noção de cidadania”. Essa noção organiza a construção de
uma cultura democrática. (DAGNINO, 1994,p. 104) Também na América Latina a
experiência dos movimentos sociais está levando a uma redefinição no que se
entende por cidadão, não apenas em relação aos direitos à diferença.
Isto
implicaria uma perda de substância no conceito de cidadania manipulado por
juristas: mais do que como valores abstratos, os direitos são importantes como
algo que se constrói e muda com as práticas e discursos. A cidadania e os
direitos não falam unicamente da estrutura formal de uma sociedade; indicam,
além disso, o estado da luta pelo reconhecimento dos outros como sujeitos de
“interesses válidos, valores pertinentes e demandas legítimas”. Os direitos são
reconceitualizados como “princípios reguladores das práticas sociais, definindo
as regras das reciprocidades esperadas na vida em sociedade através da
atribuição mutuamente consentida (e negociada) das obrigações e
responsabilidades, garantias e prerrogativas de cada um”. (CANCLINI, 2005:36)
MANZINI-COVRE (1993), por sua vez, destaca que os movimentos sociais são
espaços para lutas que ampliarão a cidadania da população carente.
É
preciso estar atento porque as organizações podem ter seus interesses originais
desvirtuados. Sindicatos que deviam lutar pelos trabalhadores, passam a
geri-los. Um exemplo é o sindicalismo de resultado. As organizações podem ainda
ser cooptadas por partidos políticos. Se respeitarem os movimentos e o diálogo,
os partidos podem ajudar as organizações a serem efetivas. O problema é quando
passam a manipular o movimento e usá-lo para interesses partidários. Os canais
de representação, como sindicatos e partidos, devem atuar em prol dos
interesses coletivos dos representados. Diante desse cenário, os sujeitos devem
agir e lutar por seus direitos. Esse é o pressuposto básico para a cidadania.
Em suma, insisto sobre os contornos da cidadania plena. O primeiro passo é
aquela revolução interna, na qual o rompimento com o autoritarismo e com o
consumismo começa em cada uma das subjetividades – em cada um de nós, portanto,
a todo momento – e da qual extraímos a força subjetiva de se sobrepor ao
cotidiano e, pouco a pouco, ao mundo, ao capitalismo. Externamente em termos da
sociedade global, devem ser mantidas as condições mínimas de democracia como
espaço para avançar.
É
necessário agir com a consciência de que a democracia se constrói a todo
instante nas relações sociais. “É preciso criar espaços para reivindicar os
direitos, mas é preciso também estender o conhecimento a todos, para que saibam
da possibilidade de reivindicar”. A criação desses espaços passa pela
comunicação. GENTILLI (2005) defende que o cidadão precisa ter acesso à
informação pública e que essa é uma condição para a ampliação de seus direitos.
Claro que a falta de democratização da mídia, a face industrial da produção da
notícia e o alcance limitado da comunicação popular devem ser considerados, mas
isso não deve impedir que se trabalhe em prol do direito da informação e contra
essas estruturas limitantes. É preciso que o jornalismo cumpra seu dever de
informar e que o cidadão tenha o direito de informação. Essa função também deve
ser cumprida pela comunicação popular.
Assim,
os cidadãos serão informados sobre seus direitos civis, políticos e sociais, e
poderão exercer seus direitos de cidadania. A informação sobre os direitos é
matéria-prima para que se realize uma cidadania ativa e se chegue à revolução
interna de que fala MANZINI-COVRE (1993). Essa revolução interna possibilitará
a cidadania plena e vai de encontro com a reflexão de HELLER (1989,p.117) sobre
um pensamento de Marx: Marx disse que, transformando o mundo, os homens se
transformam a si mesmos. Não modificaremos substancialmente o seu pensamento se
alterarmos sua frase e afirmarmos agora que não podemos transformar o mundo se,
ao mesmo tempo, não nos transformarmos a nós mesmos. Essa transformação deve
alcançar espaço na nossa vida cotidiana, como defende HELLER, mas também na
comunicação, seja ela a comunicação popular ou o jornalismo dos conglomerados de
comunicação. Informando sobre os direitos, contribui-se para a construção da
cidadania.
A Câmara de Lavras
contribui para o processo de cidadania do município, de forma objetiva, desde a
criação da TV Câmara em 2004, em que o projeto venceu resistências de alguns
vereadores da época e setores da comunidade e hoje está totalmente consolidado,
em canal digital, mostra com transparência as atividades do plenário AO VIVO
para o cidadão assistir e fiscalizar o desempenho do seu vereador e acompanhar
as decisões que influem no dia a dia da comunidade, como a legislação municipal,
que normatiza o transporte coletivo em Lavras, desde a quantidade de empresas
que prestam o serviço de transporte coletivo aqui, até o aumento do valor da
passagem, quando é colocado em pauta para os vereadores decidirem. O cidadão em
Lavras recebe a provocação diária da TV Câmara, que oferece a ferramenta: a transmissão semanal da Reunião da Câmara,
sem edição e dentro do contexto, para que o cidadão possa se informar e exercer
sua missão de fiscalização do poder público.
Enfim, em ano
eleitoral, é importante que cada cidadão se posicione e vote com consciência,
nesta que deverá ser a eleição decisiva para os novos tempos de uma política
sadia, com enterro da corrupção e dos males da política que tem atrapalhado
muito o Brasil. Mas, se o cidadão, que tem o poder de escolher seu
representante em todas as instâncias de poder e cobrar desempenho deste, não
tem posicionamento ético definido e conduta moral correta rígida no dia a dia, como não jogar lixo no
chão, não furar fila, não terá forças para exigir o comportamento modelo dos
governantes, se não pratica a lisura e correção no seu dia a dia. É hora de
cobrar, mas ao mesmo tempo, nos reeducarmos para termos condições de sermos
inflexíveis na fiscalização do exercício dos mandatos dos nossos representantes na vida pública brasileira.
Cidadania é uma conquista diária, que o cidadão pratica e ao mesmo tempo pode cobrar do seu representante no poder público
Reviewed by JAB-Jornalista Aureliano Borges
on
janeiro 21, 2018
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Um comentário:
Falar de cidadania é bastante pertinente no contexto atual, quando muitas vezes esse conceito é tratado de forma equivocada pelos meios de comunicação corporativos. Artigo muito bom e bem elaborado. Parabéns Aureliano!
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